quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Impressões na alma

Perdi meu pai com 11 anos, vítima de um raio de trovoada. Portanto, a chuva, a água, além de vida, para mim também significa morte. Os dias que antecederam esta enchente foram angustiantes. O céu sempre escuro e a água descendo aos baldes. O rio subindo também trazia lembranças ruins, das cheias de 83 e 84, quando acordamos de madrugada, vendo a água subindo pelo assoalho de nossa casa. Tivemos que sair às pressas, com a roupa do corpo, e com uma canoa encontramos local seguro.
Nessa de agora, acompanhei a água subindo lá no final da rua. Construí nossa casa em local que não deveria ser atingido, mas foi. A noite de quinta-feira foi passada em claro, por mim, minhas irmãs, minha mãe, e uma vizinha, com um bebê. Não era mais possível sair de carro, a água já estava na escada da casa. O jeito foi esperar amanhecer o dia e pular o muro de dois metros nos fundos, saindo em direção a estrada geral do bairro.
Tenho muito que agradecer, pois não perdemos nada. Fomos acolhidos por pessoas maravilhosas. Nossa família, que andava meio ‘espalhada’, se uniu pra se ajudar. Os momentos de dificuldade foram resolvidos com calma e racionalidade. Aprendi muito naqueles dias. Aprendi que o ser humano tem muitas qualidades, que sabe estender a mão ao próximo. Mas também vi muita coisa triste, que nem é bom expor. São em situações extremas que as máscaras caem, que quem é do bem, mostra que é, e quem não é também mostra.
Quando eu conseguia dar uma paradinha em meio a correria daqueles dias, de ir atrás do básico, para ajudar onde estávamos, ficava pensando...Sei que nosso planeta não irá se extinguir, mas que haverá uma grande transformação, que já começou com esses desastres naturais, com a violência acentuada, e que tudo isso irá se intensificar a partir do próximo ano.
Será como um parto, muito dolorido, que a humanidade terá que passar, para que uma nova humanidade surja. Mais humana. Mais solidária. Menos egoísta. Meu coração, ao mesmo tempo que deseja fortemente isso, sofre horrores vendo a casa da vizinha caída no chão, ouvindo no rádio que crianças estão sem leite, que animais ficaram abandonados. Meu coração dói horrores quando vejo pessoas que não se importam nada com tudo isso.
Também fico pensando se as medidas preventivas irão adiantar alguma coisa. Se estamos fadados a passar por essas transformações de qualquer maneira. Podem não resolver, mas com certeza irão minimizar os problemas.
Tomara que o acontecido tenha servido de aprendizado para muitos, o que eu acredito que tenha sido. Para olharmos as pessoas na rua com amor. Para darmos pelo menos um sorriso, quando não tivermos nada mais a oferecer. Ou então, que façamos o melhor em nosso trabalho, pensando sempre no bem coletivo.

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